HÁ UMA PORÇÃO DE REGRINHAS PARA SE INVESTIR
no mercado de ações, como se fosse de fato simples ganhar dinheiro nele. Uma delas, a mais clássica, é comprar na baixa para vender na alta. Um ótimo argumento que hoje seria
capaz de convencer investidores incautos a esvaziar a carteira para enchê-la de papéis de empresas -não fos se a dificuldade de saber se estamos mesmo na hora da virada ou se a descida no poço continua. Não fosse, também, a existência de mna outra regrinha, talvez ‘ mais útil, a dos dados. Longe de associar a bolsa de va lores à infeliz idéia de cassino (ela é muito mais com plexa que isso), ressalte-se que a alegoria dos dados de jogos de azar cabe muito bem na atual situação.
“A soma de três dados pode dar 18, como também pode dar 3”. diz Adriano Blanco D’Ercole, operador sê nior de renda variável do Banco BMC, para ilustrar de modo bem simples as variáveis micro e macroeconômi cas que determinam o comportamento da Bovespa hoje. Ou seja, não adianta apenas um deles dar seis, que no caso seria o dos preços baratos das ações de empresas brasileiras, se os demais dão um, como os da situação econômica externa e o da crise política brasileira, que lança dúvidas sobre a manutenção do atual comando no próximo mandato e, por conseguin te, da atual política econômica.
Por situação externa estamos falando da queda no mercado acio nário nos Estados Unidos, que não – se lin1ita à Nasdaq (de tecnologia), mas também atinge a Bolsa de Nova York, indicando que a econo mia norte-americana está, no mí nimo, se desacelerando. Estamos falando de Japão, onde a crise do méstica é aprofundada pelas in fluências que sofre dos EUA. E fa lando da Argentina, onde a crise econômica, que aprofunda-se nas suas dimensões sociais, é agravada pela instabilidade causada pela demissão do ministro da Economia, Ricardo López Murphy, e cujo con tágio ao Brasil pode ser imediato.
“Quando há crise, o investidor estrangeiro vê os mercados emer gentes em bloco e há um efeito contágio. Além do que, o estrangeiro tende a vender ativos para fa zer caixa a fim de recompor as per das que teve”, diz Alexandre Cam pos, gestor de renda variável do ING Investment Management .
APESAR DE VOCÊ.
Assim,não há bons fundamentos domésticos que resistam. E há, de fato, bons ‘ fundamentos. Indicadores macroe conômicos como vendas reais, pes- soal empregado, horas trabalhadas e salários líquidos reais, divulgados pela Confederação Nacional da In dústria (CNI), apresentaram em ja neiro deste ano variações respectivas de 15,81o/o, 2,28%, 7,65% e 7,14% em relação a igual mês do ano passa do. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a produção industrial em janeiro cresceu 11,2% em relação ao mesmo período de 2000, registrando o melhor resultado do mês desde 1995.
Outro exemplo: o coordenador de renda variável da Itaú Corretora, Reginaldo Alexandre, aponta que, por mera observação dos balanços de 2000 já divulgados, os resultados operacionais das empresas apresen tam sensível melhora em relação ao exercício anterior. (Os resultados lí quidos não, porque em muitos casos são afetados pela alta do dólar, que onera a dívida das companhias em moeda norte-americana.)
Além disso, seis especialistas de cinco instituições financeiras con cordam com o fato de que as ações brasileiras estão baratas em relação a seus pares de países emergentes e também em relação aos preços de um ano atrás. Se é assim, por que os papéis nativos não andam, mostran do um descolamento efetivo em re lação às Bolsas internacionais (ainda mais com a trajetória de juros des cendente no longo prazo, apesar do dólar em alta)?
Responde Gilberto Poso, diretor de operações com clientes da Lloyds Asset Management (LAM): a alta dependência de dinheiro de fora no empresas, não impulsionarem a valorização do Ibo vespa é o maior prêmio que passou a ser exigido no mundo para se investir no mercado acionário. “Em bora a Bovespa apresente força própria, um de seus principais combustíveis é o investimento estrangei ro”, diz Paes. Até o fechamento desta edição, o Iboves pa havia se valorizado 3% no ano.
Se é assim, qual conduta o investidor deve tomar? É claro que a resposta depende do perfil do aplicador. Mas, em geral, os especialistas ouvidos estão pouco otimistas quanto ao curto praw, ou seja, até os próximos dois ou três meses. Para quem não entrou, o ideal seria esperar.
“Até que essa paranóia seja dissipada, haverá mo mentos de tensão”, diz Poso, da LAM. Para os investidores agressivos, que querem aproveitar o período de baixa para arriscar desafiando os prognósticos, ele re comenda que entrem com um terço ou, no máximo, a metade dos recursos que pretendiam investir. “En quanto a situação estava ruim só na Nasdaq, era uma coisa. Mas, quando atinge o Dow Jones, é outra”, diz. Poso lembra que há um ano este índice não ficava abaixo da barreira psicológica dos 10 mil pontos.
O profissional diz não ter observado ainda o resgate, significativo dos coristas de fundos de ações nem dos in vestidores institucionais, mas faz uma ressalva: se o cená rio desfavorável perdurar por mais dois meses, a situação muda. Os investidores vão querer se desfazer dos ativos mesmo a preços bastante baixos.
Penteado, da ABN-Amro Asset Management, também avalia que maio será um momento decisivo para a Bolsa se recuperar. Ele acredita na retomada da economia norte-ame ricana na forma de U, ou seja, hoje ela estaria fazendo a curva para baixo e, depois de atingir o fundo, voltaria a subir. Descarta tanto a previsão otimista do V, em que a recuperação seria mais rápida, como a pessimista do L, em que a descida seria seguida de uma longa estagnação, colocando os países emergentes em péssima situação.
DESAVISADOS. Para o eco- nomista-chefe da Itaú Corretora, Marco Maciel, os investidores que, hoje estão se arriscando a comprar têm procurado aplicar baixas quan tias, mas, como a liquidez é pequena, o movimento acaba puxando mo mentaneamente o preço de alguns papéis, o que indevidamente anima os investidores desavisados que pensam tratar-se de uma recuperação.
A dica de Reginaldo Alexandre, também da Itaú Corretora, é o investidor levar em consideração a volatilidade dos mercados, que em geral indicam nervosismo, fator de análise fundamentalista feita pelos especialistas, na qual são calculados apenas dados objetivos.
D’Ercole, do BMC, prevê muita volatilidade, mas acredita que no fi nal do ano o vetor é positivo, com o Ibovespa atingindo entre 19 mil e 20 mil pontos. “O ideal é tentar acertar o momento de entrar e sair, evitan do ficar aplicado durante o tempo todo’:diz. É o que ele faz na condi ção de operador da tesouraria do banco, onde tem autonomia para gi rar o dinheiro do banco da forma que achar mais conveniente.
Já os fundos de ações, por especi ficações técnicas e de tributação, são obrigados a manter um volume nú nimo aplicado na Bolsa, mesmo em situações de perda para o cotista.