Especial: Dividendo não acompanha harmonização contábil

Data Original: 03/07/2006
Postado em: 28 de outubro de 2016 por: Reginaldo Alexandre
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Estadão - Reportagens

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A contabilização de dividendos não acompanhará a harmonização contábil na nova deliberação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) sobre registros de eventos que acontecem após a publicação do balanço da empresa (nº 505). Essa regra foi publicada no último dia 19 de junho juntamente com a 506, que trata de mudanças nas estimativas contábeis e correção de erros. Segundo profissionais que acompanham a evolução das normas de contabilidade no Brasil, as regras da autarquia procuram,novamente, se alinhar ao sistema internacional, e adotam procedimentos do Instituto Brasileiro dosAuditores Independentes (Ibracon).

As novas determinações, que deixam o processo mais claro, fazem parte do esforço do mercado brasileiro para se adequar a regras mais modernas, enquanto espera-se pela aprovação da Lei Contábil,que ainda aguarda aprovação na Comissão de Finanças e Tributação (CFT) da Câmara dos Deputados. A505 aborda os eventos que ocorrem no intervalo entre o fechamento de um balanço, em 31 de dezembro de um ano, e a data de sua publicação. Se uma empresa provisionou uma provável perda com um cliente,

por exemplo, que vai à falência em janeiro, antes da divulgação dos números oficiais, passa a ser obrigada a refazer suas contas e apresentar um balanço atualizado.

Os especialistas aprovaram as alterações e dizem que, com exceção dos dividendos, estas seguem estritamente o que é pedido pelos países que integram o Internacional Accounting Standard Board (IASB). O IASB é uma fundação sem fins lucrativos com sede em Londres e que tem por objetivo divulgar normas contábeis. Suas regras são adotadas basicamente por países da Europa, mas já começam a ser seguidas por outras nações, entre elas o Brasil e futuramente os Estados Unidos.

Apesar dos avanços, a legislação brasileira (Lei das Sociedades por Ações) impediu a adequação na questão dos dividendos, contou o sócio de auditoria da KPMG, José Luiz Carvalho. Ele explicou que, no exterior, os proventos somente são registrados no balanço quando são efetivamente pagos. No Brasil a situação é diferente, e a contabilização ocorre no momento em que a distribuição é aprovada pela administração.

O sócio da área de risco e qualidade da PriceWaterhouseCoopers (PwC) e membro da comissão nacional de normas técnicas do Ibracon, Tadeu Cendon, acredita que um dos principais avanços da deliberação 505 é a exigência de que a diretoria assine as demonstrações financeiras, num processo que se aproxima das regras mais rígidas de controle de risco impostas pela lei norte-americana de governança corporativa Sarbanes-Oxley.

O superintendente de normas contábeis e de auditoria da CVM, Antônio Carlos de Santana, diz ainda que,nessa deliberação, a administração é obrigada a checar todos os possíveis eventos subseqüentes comimpacto nos números dez dias antes da previsão de divulgação do balanço, investigando todas as alterações.

Ainda no que diz respeito a essa deliberação, Carvalho conta que a idéia é tornar mais objetiva a maneira como uma empresa reconhece um evento subseqüente ao balanço do ano anterior. A empresa deve mudar seus números, por exemplo, quando obtém a informação, após a data de fechamento das demonstrações, de que um ativo estava deteriorado ou que o montante de um prejuízo por deterioração previamente reconhecido precisa ser ajustado. Um exemplo é a falência posterior de um cliente,confirmando que já existia um prejuízo em uma conta a receber na data do balanço, e que a entidade precisa ajustar o valor contábil da conta a receber.

Na opinião do diretor técnico da comissão de assuntos contábeis da Apimec e gestor de recursosReginaldo Alexandre, a regra 505 não deve trazer muitas mudanças aos balanços, sobretudo porque trata-se de uma teorização sobre práticas que já vinham sendo adotadas pela maioria das empresas. “Na prática isso já existia, mas agora há a obrigação do reconhecimento.” Ele também conta que as revisões de balanços são raras.

No caso da 506, sobre estimativas e correção de erros, Alexandre conta que a deliberação traz um refinamento sobre as práticas das empresas. Elas agora terão de deixar claro o critério utilizado para mudar uma estimativa já feita, e quais os efeitos gerados. Um exemplo de mudança de projeção, diz ele, éa alteração da uma expectativa de vida útil de um ativo, o que determina sua depreciação, ou ainda a exaustão de uma mina de minério. “Os efeitos contábeis em geral ocorrem sobre períodos futuros.”

“O grande impacto no caso de erros é que a empresa deverá apresentar um balanço ajustado do ano anterior, o que anteriormente era feito nos números do ano seguinte”, complementa Carvalho, da KPMG. Cendon, da PwC, acredita que o grande mérito da nova deliberação é a eliminação de potenciais riscos de inconsistências, por meio da criação efetiva de uma regra sobre o assunto. Ele contou também que,apesar de as regras valerem a partir de 1º de janeiro de 2007, as companhias já terão de publicar em 31 de dezembro de 2006, juntamente com os balanços, avisos sobre quais seriam as mudanças para o período caso as novas regras fossem adotadas. As novas determinações seguem as divulgações, em setembro do ano passado, das deliberações 488 e 489, que tratam respectivamente de considerações gerais para a apresentação de demonstrações contábeis e de provisões, passivos, contingências passivas e contingências ativas e procedimento de contabilidade. À época, Santana, da CVM, previa que as próximas normas a serem publicadas seriam sobre contabilização das subvenções governamentais e o valor de recuperação dos ativos, o que não ocorreu.

Ele explicou que o mercado avalia vários assuntos ao mesmo tempo, e que as deliberações 505 e 506acabaram passando à frente das previsões por serem mais simples. Santana contou ainda que, no que concerne à contabilização de subvenções do governo, o próprio IASB decidiu que irá revisar sua regra correspondente, o que paralisou os trabalhos no Brasil. Decisão semelhante ocorreu com a regra sobre divulgação de informações financeiras por segmento de negócios, que estava praticamente pronta e foi suspensa pois o IASB declarou que irá se aproximar das regras dos Estados Unidos.

O superintendente da CVM disse que, além da instrução sobre fundos, em audiência, outros assuntos já estão sendo discutidos em relação a regras de contabilidade. Entre elas está a contabilização de gastos com distribuição de ações ou títulos de dívida.

(Aline Cury Zampieri)

Sobre

Economista, com vinte anos de experiência na área de análise de investimentos, como analista, coordenador, organizador e diretor de equipes de análise, tendo ocupado essas posições, sucessivamente, no Citibank, Unibanco, BBA/Paribas, BBA (atual Itaú-BBA) e Itaú Corretora de Valores. Atuou ainda como analista de crédito corporativo (Citibank) e como consultor nas áreas de estratégia (Accenture) e de corporate finance (Deloitte). Hoje, atua na ProxyCon Consultoria Empresarial, empresa que se dedica às atividades de assessoria e prestação de serviços nas áreas de mercado de capitais, finanças e governança corporativa.

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