O Analista de Valores Mobiliários no Brasil

Data Original: 05/04/2014
Postado em: 14 de dezembro de 2016 por: Reginaldo Alexandre
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A atividade de analista de valores mobiliários no Brasil é regulamentada desde 2003, ano em que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) – órgão que regula o mercado brasileiro de capitais – editou sua Instrução 388, que passou a disciplinar a profissão.

A Associação Brasileira dos Analistas e Profissionais de Investimento – APIMEC –, fundada há mais de 40 anos, vinha oferecendo exames de certificação para o exercício da profissão  mesmo antes de a Instrução 388 entrar em vigor.

A Instrução original passou por três modificações, a última das quais em 2010, através da Instrução CVM 483, que substituiu a norma original.  Na esteira dessa última mudança, a Apimec, por delegação do órgão regulador do mercado de capitais, além de certificadora, passou a ser também entidade fiscalizadora da profissão de analista de valores mobiliários.

A Apimec exerce as atividades de certificação e de fiscalização com base no preenchimento de requisitos técnicos previstos na Instrução; não há garantia de exclusividade.

A autorregulação é uma tendência firme no mercado brasileiro de capitais, desde que o regulador constate capacitação técnica e isenção das entidades representativas do mercado (normalmente entidades de classe, sem fins lucrativos) que poderiam exercê-la.

A autorregulação nem sempre é delegada.  Na área contábil, por exemplo, o Comitê de Pronunciamentos Contábeis  (CPC) – órgão formado por entidades do setor privado, onde os reguladores são  ouvintes, mas sem voto nas decisões – é encarregado de emitir as normas contábeis brasileiras, sempre com base nas normas contábeis internacionais (IFRS), que o Brasil adotou.

Há ainda a experiência bem sucedida do Novo Mercado, segmento de negociação onde as empresas listadas comprometem-se, voluntariamente, mas com base em um contrato, a ter práticas de governança corporativa mais estritas do que aquelas previstas pela legislação.  Mais recentemente foi criado o Comitê de Aquisições e Fusões, sob o comando exclusivo de entidades privadas, com o objetivo de supervisionar operações de aquisição e fusão entre empresas, nos moldes do Control Panel inglês.

A Instrução define como analista de valores mobiliários “a pessoa natural que, em caráter profissional, elabora relatórios de análise destinados à publicação, divulgação ou distribuição a terceiros, ainda que restrita a clientes.”

Entende-se como “relatório de análise” quaisquer textos, relatórios de acompanhamento, estudos ou análises sobre valores mobiliários específicos ou sobre emissores de valores mobiliários determinados que possam auxiliar ou influenciar investidores no processo de tomada de decisão de investimento.  Exposições públicas, apresentações, reuniões, conferências telefônicas e quaisquer outras manifestações não escritas, cujo conteúdo seja típico de relatório de análise, são equiparadas a relatórios de análise.

A atividade de analista de valores mobiliários pode ser exercida autonomamente ou por vinculação a instituições integrantes do sistema de administração e distribuição de valores mobiliários, ou ainda no âmbito de empresas que tenham em seu objeto social exclusivamente a atividade de análise de valores mobiliários.

A Instrução traz uma exceção notável: ela não se aplica a pessoas naturais ou jurídicas que desenvolvam atividades de classificação de risco.

A Instrução 483 prevê que o analista de valores mobiliários deve agir com probidade, boa fé e ética profissional, empregando na atividade todo cuidado e diligência esperados de um profissional em sua posição.  Prescreve ainda algumas regras e algumas vedações – inclusive de negociação – com o objetivo de prevenir conflitos de interesse, seja por parte do analista, seja por parte da entidade a que esteja vinculado.  Os analistas de valores mobiliários devem assinar e acatar um Código de Ética, aprovado pela CVM, antes de se credenciarem para o exercício da profissão.

A Apimec, em sua função de  órgão de fiscalização, recebe todos os relatórios emitidos pelos analistas de mercado, para verificar sua adequação às condições previstas na Instrução 483.  Os eventuais desvios são punidos de acordo com a gravidade da falha ou da transgressão.  As penalidades compreendem, nos casos mais simples, advertência ou multa, podendo chegar, nos casos mais graves, à suspensão temporária ou mesmo impedimento do exercício da profissão.

Embora os procedimentos operacionais estejam a cargo da Apimec, as decisões relativas à fiscalização são tomadas por um Comitê de Supervisão do Analisa (CSA), um órgão que reúne pessoas de notório saber e experiência e representantes de entidades de diversos segmentos do mercado de capitais, em cuja composição os analistas são franca minoria. A forma de constituição do CSA visa preservar um alto grau de isenção e independência em seus processos e decisões.

Os exames de certificação são oferecidos pela Apimec em tempo contínuo, e são realizados em centros de teste distribuídos em praticamente todo território nacional (algo importante em um país de dimensões continentais como o Brasil). A certificação está dividida em três categorias: CNPI para o analista fundamentalista,CNPI-T para o analista técnico e CNPI-P para o analista pleno (fundamentalista e técnico).

Para obtenção da certificação o profissional deve ser aprovado nos seguintes exames:

CB – Conteúdo Brasileiro – fase comum para o analista fundamentalista, técnico e pleno.
Uma prova com 60 questões abordando as seguintes matérias: Sistema Financeiro Nacional, Mercado de Capitais, Mercado de Renda Fixa, Mercado de Derivativos, Conceitos Econômicos, Ética e Relacionamento, Governança Corporativa.

CG1 – Conteúdo Global 1 – fase para o analista fundamentalista.
Uma prova contemplando questões a respeito dos seguintes dois grandes temas: 1) Análise e Avaliação de Ações e Finanças Corporativas; 2) Contabilidade e Análise de Demonstrações Financeiras.
CT1 – Conteúdo Técnico 1 – fase para o analista técnico.
Uma prova contendo questões sobre as seguintes matérias: Princípios de Análise Técnica; Dow, Elliott, Fibonacci e Candle Stick; Retas, Tendências e Médias Móveis; Stop, Suporte e Resistência; Volume e Contratos em Aberto.

A certificação é renovada periodicamente, através de uma nova prova ou, alternativamente, pelo atendimento às etapas de um programa de educação continuada.

O número de analistas certificados e credenciados mostra tendência de crescimento nos últimos anos, em que pesem os efeitos da crise financeira internacional  e o arrefecimento mais recente das taxas de crescimento da economia brasileira, em contraste com a forte expansão observada na década passada, que contribuiu para um substancial alargamento do número de companhias abertas e dos volumes negociados no mercado brasileiro de capitais.

Ainda que não viva um momento  particularmente favorável neste momento, o mercado acionário brasileiro ainda mostra números exuberantes: o mercado de ações movimenta, internamente, entre €2 bilhões e  €2,5 bilhões por dia.  A esse montante se junta volume semelhante negociado nas bolsas norte-americanas, na forma de American Depositary Receipts (ADRs).

No total, portanto, temos um volume consolidado entre €4 bilhões e  €5 bilhões negociado diariamente com ações de empresas brasileiras, sendo investidores estrangeiros responsáveis por perto de dois terços desse movimento (considerando sua participação no volume negociado internamente e naquele transacionado nos Estados Unidos e outros mercados).

Essas características conferem ao mercado acionário brasileiro um elevado grau de internacionalização, que se reflete na atividade e no mercado de trabalho dos analistas de valores mobiliários, aumentando, ao mesmo tempo, a responsabilidade dos profissionais e as exigências de abrangência, apuro e tempestividade dos processos de certificação e fiscalização da profissão.

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Sobre

Economista, com vinte anos de experiência na área de análise de investimentos, como analista, coordenador, organizador e diretor de equipes de análise, tendo ocupado essas posições, sucessivamente, no Citibank, Unibanco, BBA/Paribas, BBA (atual Itaú-BBA) e Itaú Corretora de Valores. Atuou ainda como analista de crédito corporativo (Citibank) e como consultor nas áreas de estratégia (Accenture) e de corporate finance (Deloitte). Hoje, atua na ProxyCon Consultoria Empresarial, empresa que se dedica às atividades de assessoria e prestação de serviços nas áreas de mercado de capitais, finanças e governança corporativa.

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