“A adequada transparência resulta em um clima de confiança, tanto internamente quanto nas relações da empresa com terceiros.” O tema, extraído do código de melhores práticas de governança corporativa elaborado pela liderança nacional no assunto (o IBGC), talvez não emocione o investidor recém-chegado à bolsa, mas não tem passado despercebido por grande parte do mercado, mesmo em tempos de forte instabilidade. Um estudo realizado pelo professor Antonio Zoratto Sanvicente, do Insper – Instituto de Ensino e Pesquisa, mostra que o chamado “custo total de negociação” das ações, que envolve desde os gastos com corretagem até os prêmios ou descontos exigidos pelos aplicadores nas transações, vem caindo ao longo dos anos. E o principal motivo é o nível de governança de um grupo de companhias, que se reflete em menor volatilidade para determinados papéis.
Sanvicente avaliou dados diários relativos a dez anos, de 1999 a 2009, intervalo no qual o custo médio total de transação recuou de 2,95% para 1,22%. O acompanhamento revela que o efeito se acentuou a partir de 2004, ano que marca o início de um período fértil para o mercado de capitais, que teve seu ápice em 2007, quando uma forte onda de estreias no Novo Mercado deu novos contornos para a bolsa paulista.
“Fica claro que as ações de empresas listadas em segmentos de governança (níveis 1 e 2 e Novo Mercado da BM&FBovespa), nos quais se exige maior transparência na divulgação de informações, são negociadas a custos mais baixos”, destaca o especialista. Segundo ele, as conclusões gerais valem para os dias de hoje, pois mesmo computando dados dos dois últimos anos não haveria mudanças estatísticas relevantes. No acompanhamento, foram considerados somente papéis com transações em pelo menos 100 dos cerca de 250 pregões existentes a cada ano.
A pedido do Valor, o acadêmico calculou ainda a volatilidade, neste ano, das 115 ações que integravam o Novo Mercado no fim de julho. O resultado médio ficou em 37,3%, contra 48,9% de uma lista correspondente de 106 papéis que não fazem parte do segmento mais elevado de governança da bolsa – mostrando que, de fato, o sobe e desce das cotações é bem diferente entre os grupos analisados.
“Os níveis mais elevados de governança reduzem a assimetria de informações e deixam o investidor mais confiante”, afirma Sandra Guerra, presidente do conselho de administração do IBGC. “Os resultados mostram que, mesmo em cenários de crise, o investidor leva a sério esse diferencial”, completa Reginaldo Alexandre, presidente da seção SP da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais (Apimec).
Analisando apenas os dados relativos a 2012, chama a atenção o número de empresas de energia elétrica entre as menos voláteis no universo das integrantes do Novo Mercado. De um grupo de dez, quatro são elétricas (Tractebel, Energias do Brasil, CPFL e Light). Uma realidade que pode mudar nos próximos meses, em função de notícias relacionadas a revisões tarifárias e renovações de concessões – temas que têm afetado o setor. Na outra ponta, entre as ações listadas no Novo Mercado com maior volatilidade no ano, cinco têm negócios nas áreas de petróleo ou mineração (HRT, Lupatech, OGX, Portx e MMX), segmentos nos quais prevaleceu por um bom tempo um viés negativo por parte dos aplicadores, mas que recentemente ensaiaram uma mudança de direção.
Sanvicente explica que o cálculo do custo de transação de ações abrange uma série de gastos. Ele classifica como “explícitos” aqueles decorrentes de despesas com taxas de corretagem e da bolsa, além de impostos, como o IOF (incidente sobre operações financeiras). São considerados também custos resultantes da assimetria de informações entre compradores e vendedores, refletidos no prêmio ou desconto exigido por uma das partes para fechar a transação. Estes últimos, no entanto, não são diretamente observáveis, portanto o acadêmico os caracteriza como “implícitos”. A combinação dos dois gera a média final.
É importante que o investidor saiba, no entanto, que pertencer ou não a um nível diferenciado de governança não garante riscos maiores ou menores de fortes emoções no pregão. Sandra, do IBGC, observa que nessas análises sempre existirão questões intangíveis. Uma companhia com um conselho de administração qualificado e com membros independentes, por exemplo, tende a tomar decisões melhores. Mas, para isso, o conselho tem de efetivamente assumir o papel de deliberar e supervisionar a estratégia da empresa, o que nem sempre acontece. (Por Márcio Anaya)