A disparada do mercado de ações brasileiro levou o Ibovespa a encostar nesta semana nos 67 mil pontos, no mais elevado patamar em quase cinco anos. Isso deixou o índice acionário a apenas cerca de 10% de alta para alcançar seu recorde histórico, os 73.516 pontos registrados em 2008. A recuperação das commodities, as máximas computadas em Wall Street e as expectativas de melhora da economia brasileira — o que inclui a trajetória de queda de juros— entram na conta da valorização do mercado local e ajudam a explicar, segundo analistas, o porque de o índice caminhar para um nível tão alto em um momento econômico ainda desfavorável.
Diferentes analistas esperam que o Ibovespa supere sua marca histórica ainda este ano. O UBS, por exemplo, trabalha com um cenário base em que o Ibovespa atinja os 77 mil pontos até dezembro, um potencial de alta de 16% em moeda local e de 20% em dólares. Ontem, o banco elevou sua recomendação para ações brasileiras no portfólio global para “c o m p r a”. Em relatório, os analistas Alan Alanis e Sambuddha Ray afirmam que os fundamentos econômicos final-mente estão melhorando e que co-meçam a aparecer revisões para ci-ma de lucros de empresas. O J.P. Morgan também elevou há pouco — no fim de janeiro — a recomendação para Brasil em seu portfólio de mercados emergentes, para “overweight ” (acima da média do mercado).
A expectativa da casa é que o Ibovespa chegue a 74.800 pontos no final do ano. No relatório que explica a nova projeção para o Ibovespa, a ana-lista Emy Shayo, do J.P. Morgan, afirma que o Brasil dá continuidade a seu processo de recupera-ção e cita a queda nas taxas de juros. Segundo ela, o Brasil historicamente mostra retornos positivos de ações (antes, durante e de-pois) de ciclos de alívio monetário, com média de ganho de 26%.
Segundo analistas, o que explica o movimento positivo atual da bolsa — em um momento tão diferente do vivido em 2008 — são as perspectivas de melhora dos cenários tanto no exterior quanto da economia brasileira, especialmente para os próximos anos. Em maio de 2008, quando o Ibovespa estava em seu pico histórico, o Brasil tinha acabado de receber o grau de investimento das agências de classificação de risco— que tiraram o selo de bom paga-dor do país em 2015.
Em 2007, o PIB brasileiro cresceu 6,1% e, em 2008, 5,1%. Em contraste, o Brasil acumula agora dois anos de retração (-3,8% em 2015 e a projeção dos economistas é de nova queda de 3,5% em 2016). No cenário internacional, o barril de petróleo Brent, negociado na Inglaterra, valia cerca de US$ 120,00 e hoje é cotado ao redor de US$ 56,00. “O mercado olha sempre dois anos à frente”, diz o estrategista Paulo Gala, da Fator Administração de Recursos (FAR).
“Uma hora a recessão vai acabar”, afirma, lembrando que a queda do custo do CDS (Credit Default Swap, espécie de seguro contra calote) para a mínima em dois anos, per-to de 250 pontos-base, confirma a melhora da percepção de risco do investidor. “Todos os indica-dores de confiança da economia estão melhorando,” diz.
“Em 2008, analistas viam que o mercado estava chegando a um momento de saturação. Agora é o contrário, é a saturação do fundo”, diz o coordena-dor do laboratório de finanças do Insper, Michel Viriato.
O câmbio é outro elemento que favorece a escalada recente do Ibo-vespa rumo à sua máxima histórica em moeda local. O dólar fechou 2008 cotado a R$ 2,33, ante R$ 3,09 de ontem. Com isso, o Ibovespa ainda está muito longe de 2008 em dólares. O índice opera em torno dos 21.500 pontos em dólares sen-do que, em maio daquele ano, es-tava em 43 mil pontos. Ou seja, há espaço para o Ibovespa dobrar de valor nesse parâmetro.
Especialistas avaliam que os investidores estrangeiros, responsáveis por 52%da movimentação da Bovespa, de-vem continuar colocando recursos em ações brasileiras este ano, mesmo que com menor intensidade. No ano, o fluxo positivo de recur-sos é de R$ 6,119 bilhões. No exterior, as bolsas dos Esta-dos Unidos têm renovado a cada dia suas máximas históricas, em meio à expectativa de expansão das principais economias globais — EUA, Europa e China. Reginaldo Alexandre, sócio da Proxycon e ex-presidente da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais (Apimec), diz que en-traves locais estavam impedindo o Ibovespa de acompanhar com a mesma intensidade a melhora forte nas bolsas dos Estados Unidos.
Os recordes americanos melhoram o tom dos mercados, re-forçando as perspectivas favoráveis para o Ibovespa. Mas a confirmação da recuperação da bolsa brasileira, entretanto, vai depender da intensidade e da efetividade dos ajustes locais em curso. A expectativa de crescimento global também tem ajudado na recuperação do preço das commodities — fator relevante para o Ibo-vespa. Desde a mínima de 2016, em 26 de janeiro, o Ibovespa já subiu 78,5%. Grande parte desse ganho foi sustentado pela recuperação dos preços de commodities importantes para companhias de peso no índice: petróleo e minério de ferro.
Nesse período, o petróleo Brent teve valorização de 76,5%, chegando a US$ 56,13 o barril. O minério de ferro em Qingdao, na China, subiu 124%, a US$ 92,23 a tonelada. Segundo especialistas, os preços devem seguir em valorização, ainda que em ritmo menor.
O ganho das commodities fez com que as ações de mineração, siderurgia e petróleo retomassem parcialmente o peso no Ibovespa no último ano. As ações de Brades-par, Gerdau, Gerdau Metalúrgica, CSN, Usiminas, Vale e Petrobras passaram de uma fatia de 13,8% na carteira do Ibovespa do início de 2016 para 21,3% no portfólio atual. O setor financeiro permanece na liderança, com 36% do total. O diretor de renda variável do Santander, André Rosenblit, diz que parte do novo nível dos merca-dos acionários — e não apenas do Ibovespa — é explicada pela liquidez global ainda abundante no mundo, impulsionada pelos pro-gramas de afrouxamento monetário dos Estados Unidos e Europa após a crise financeira mundial.