Bolsa é questionada por limites de aluguel

Data Original: 14/05/2013
Postado em: 17 de dezembro de 2016 por: Reginaldo Alexandre
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Reportagens - Valor Econômico

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As recentes mudanças feitas pela BM&FBovespa no segmento de aluguel de ações irritaram acionistas da OGX e também da Eletropaulo. Participantes do mercado viram a decisão da bolsa de elevar os limites operacionais para empréstimo dos papéis como uma forma de favorecimento indireto aos “vendidos” – aqueles que alugaram os papéis apostando na queda dos preços.

Os investidores também questionam se a própria bolsa – que é uma companhia aberta e aufere ganhos com o aumento dos negócios – não teria se beneficiado da medida, uma vez que o limite maior incrementou o volume negociado no empréstimo de ações e no mercado à vista.

O investidor José Claudio Pagano, acionista da OGX, enviou à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) uma reclamação sobre a maneira como a Bovespa ampliou o limite de aluguel dos papéis da petroleira. A primeira mudança, em 18 de março, elevou o limite de 20% para 30% do total de ações em circulação. Na semana passada, esse teto foi elevado novamente, para 45%, mas sem nenhum comunicado formal ao mercado. As informações precisam ser consultadas na Bovespa, em um local de seu site difícil de ser encontrado.

“Peço que a autarquia obrigue a Bovespa a informar mudanças como essa ao mercado com ao menos 90 dias de antecedência”, afirma Pagano na reclamação. O investidor disse ao Valor que suas operações foram “muito prejudicadas” com as repentinas alterações. “Confiei nos limites da bolsa, comprei ações e operei no mercado de opções, que vence em 20 de maio, mas as condições mudaram.” Segundo ele, ao tomar esse tipo de decisão, a Bovespa “joga a favor dos vendidos”. “É ruim mudar as regras no meio da partida.”

Em 5 de março, um grupo de minoritários da Eletropaulo também protocolou reclamação na CVM, por conta da mudança no limite de aluguel das ações da companhia no meio do pregão de 6 de fevereiro. Os empréstimos chegaram a ser suspensos, o que fez a ação disparar 13% na abertura do pregão com a cobertura das posições vendidas, que se dá por meio da compra de papéis no mercado à vista. Após a alteração do limite e a retomada dos aluguéis, o papel fechou em alta de 1,3%.

“Causa estranheza a forma como foi feita a mudança na regra”, diz a Associação dos Minoritários da AES Elpa e AES Eletropaulo em ofício. “As suspeitas de que os procedimentos não estejam corretos recrudescem ainda mais, uma vez que tal regra foi feita somente para os ativos da Eletropaulo, não sendo estendidas às demais empresas que compõem o mercado, por exemplo, Petrobras e Vale”, alegou a entidade na ocasião.

O diretor de operações da BM&FBovespa, Cícero Vieira, admite que há “muito ruído” no mercado a respeito das regras de limite de risco nas operações como aluguel, opções e termo de ações. Em entrevista coletiva sobre o balanço da bolsa, na sexta-feira, Vieira avaliou que a política adotada para alterar esses limites “não está clara”.

Por isso, a BM&FBovespa está elaborando um esclarecimento para mostrar ao mercado que a regra já existia há mais de 10 anos, embora somente neste ano ela tenha sido aplicada de fato, em função do aumento na demanda por aluguel de ações. “A política é simples: a bolsa realoca os limites entre os segmentos de mercado [empréstimo, termo, opções e futuro] até o teto de 50%, aproveitando o limite de um segmento ocioso para outro com maior demanda.”

Para a professora da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Érica Gorga, “a regra precisa ser mais clara, e não pode mudar em função de uma conjuntura de mercado”. “Se existe um limite, o mercado atribui um preço ao risco de testá-lo. A partir do momento que esse limite é móvel, você pode criar uma demanda artificial.”

O presidente da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais (Apimec), Reginaldo Alexandre, considera importante que as regras sejam previsíveis. “Isso gera confiança. É uma questão que merece ser analisada com atenção”.

Quanto ao possível conflito de interesses na definição dos limites de aluguel e no aumento do volume negociado, a BM&FBovespa preferiu não comentar o assunto. Procurada, a CVM disse que não comenta casos específicos. “A CVM acompanha e analisa as operações envolvendo companhias abertas e adota as medidas cabíveis, quando necessário”, informou a autarquia.

Jorge Levy, sócio do escritório Levy & Salomão Advogados, não vê conflito de interesses na elevação do limite de aluguel de ações pela Bovespa e o consequente ganho gerado pelo aumento de volume. Segundo ele, a própria bolsa está mais exposta ao risco quando toma uma decisão dessas já que, em última instância, é a garantidora final da operação, caso investidor e corretora não entreguem a ação.

Sobre a possibilidade de a bolsa estar inflando seu próprio resultado, Levy também pondera. Segundo ele, o mesmo pode ocorrer quando o limite é mantido. “Os investidores ‘vendidos’ podem ter que correr para comprar ações no mercado, o que aumentaria o volume da mesma maneira.”

O ex-presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) Luiz Leonardo Cantidiano, do escritório Motta Fernandes Rocha Advogados, também não acredita que haja conflito de interesse. “A bolsa não está fazendo isso porque é uma companhia aberta e quer ganhar dinheiro”, afirma. “Está, na verdade, atendendo a uma demanda do mercado.” Na visão de Cantidiano, é uma obrigação da Bovespa administrar o mercado. “Deixar operações especulativas assumirem proporções ilimitadas pode trazer problemas para o próprio funcionamento do mercado. Por isso existem os limites”, diz. Para ele, o fato de os limites de OGX terem sido ampliados não prejudica quem já estava no jogo, mesmo com as mudanças sendo feitas no meio do pregão. “O mercado pode ter problemas se há uma demanda muito grande pelo aluguel e a bolsa não atende.”

O advogado Raphael Martins, escritório Faoro & Fucci, lembra que a atividade de autorregulação é, naturalmente, um caso de conflito de interesse. “A instrução CVM 461 pressupõe e legitima esse conflito. A bolsa tem que buscar o equilíbrio entre o interesse público e o próprio.” Ele lembra que a CVM pode intervir se considerar que a bolsa está se beneficiando de maneira irregular.

Sobre

Economista, com vinte anos de experiência na área de análise de investimentos, como analista, coordenador, organizador e diretor de equipes de análise, tendo ocupado essas posições, sucessivamente, no Citibank, Unibanco, BBA/Paribas, BBA (atual Itaú-BBA) e Itaú Corretora de Valores. Atuou ainda como analista de crédito corporativo (Citibank) e como consultor nas áreas de estratégia (Accenture) e de corporate finance (Deloitte). Hoje, atua na ProxyCon Consultoria Empresarial, empresa que se dedica às atividades de assessoria e prestação de serviços nas áreas de mercado de capitais, finanças e governança corporativa.

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