Algumas vozes têm se levantado ultimamente questionando a eficiência da ação do conselho fiscal em companhias abertas. Os críticos asseveram que a função fiscalizadora típica do conselho fiscal seria desempenhada de maneira mais eficaz por um comitê de auditoria, órgão especializado ligado ao conselho de administração.
Curiosamente, os debates têm passado ao largo da característica que diferencia, de modo definitivo, o conselho fiscal do comitê de auditoria: a autonomia. O conselho fiscal é um órgão sem relação de subordinação à diretoria ou ao conselho de administração.
Essa distinção é essencial. Basta lembrarmos as circunstâncias, seja no mundo corporativo, seja em situações da vida cotidiana, em que reações a atitudes ou decisões arbitrárias, controversas ou inoportunas são limitadas por motivos de hierarquia ou outras formas de dependência. Em situações extremas, para usar uma preciosa expressão popular, quem pode mais, chora menos.
Os episódios recentes envolvendo empresas que tiveram perdas superlativas com derivativos, que foram contratados em proporção bem superior àquela que seria necessária à proteção de suas posições patrimoniais ou fluxos denominados em moeda estrangeira, apenas reforçam a necessidade de instâncias fiscalizadoras dentro das companhias.
O comitê de auditoria teria uma função importante em detectar e prevenir tais problemas, mas o conselho fiscal – em razão de sua especialização e de sua independência – poderia reforçar os controles e trazer maior segurança e tranquilidade aos acionistas. O conselho fiscal é, por assim dizer, um auditor de última instância dos atos da administração – estando a efetividade do exercício desse papel vinculado ao rigor dos acionistas na escolha de seus integrantes.
O conselho fiscal é previsto na lei, que estabelece que o estatuto disporá sobre seu funcionamento, de modo permanente ou nos exercícios sociais em que for instalado a pedido de acionistas.
O conselho fiscal, quando o funcionamento não for permanente, será instalado pela assembleia geral a pedido de acionistas que representem, no mínimo, um décimo das ações com direito a voto, ou 5% das ações sem direito a voto, e cada período de seu funcionamento terminará na primeira assembleia geral ordinária após a sua instalação.
Na constituição do conselho fiscal, serão observadas as seguintes normas:
A) Os titulares de ações preferenciais sem direito a voto, ou com voto restrito, terão direito de eleger, em votação em separado, um membro e respectivo suplente; igual direito terão os acionistas minoritários, desde que representem, em conjunto, 10% ou mais das ações com direito a voto;
B) Os demais acionistas com direito a voto poderão eleger os membros efetivos e suplentes que, em qualquer caso, serão em número igual ao dos eleitos nos termos da alínea A, mais um.
A importância do conselho fiscal fica ressaltada pelas principais funções que a lei lhe atribui:
I) Fiscalizar, por qualquer de seus membros, os atos dos administradores e verificar o cumprimento de seus deveres legais e estatutários;
II) Opinar sobre as propostas dos órgãos da administração relativas a modificação do capital social, emissão de debêntures ou bônus de subscrição, planos de investimento ou orçamentos de capital, distribuição de dividendos, transformação, incorporação, fusão ou cisão;
III) Denunciar, por qualquer de seus membros, aos órgãos de administração e, se estes não tomarem as providências necessárias para a proteção dos interesses da companhia, à assembléia-geral, os erros, fraudes ou crimes que descobrirem, e sugerir providências úteis à companhia;
IV) Convocar a assembleia geral ordinária, se os órgãos da administração retardarem por mais de um mês essa convocação, e a extraordinária, sempre que ocorrerem motivos graves ou urgentes, incluindo na agenda das assembleias as matérias que considerarem necessárias;
V) Analisar o balancete e demais demonstrações financeiras elaboradas periodicamente pela companhia;
VI) – examinar as demonstrações financeiras do exercício social e sobre elas opinar.
O comitê de auditoria não substitui o conselho fiscal, o complementa. Se os críticos têm razão em mencionar que em algumas ocasiões no passado os conselhos fiscais falharam em sua função fiscalizadora, isso não se deveu a deficiências imanentes ao órgão, mas à falta de critério e de rigor dos acionistas – principalmente não-controladores – na escolha de seus membros. O conselho fiscal não deve ser lugar para amadorismo, nem deve servir de abrigo para amigos ou notáveis que não tenham as qualificações e as competências técnicas necessárias para o exercício do cargo.