A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) abriu um processo administrativo para averiguar a contabilidade de “hedge” – proteção -cambial adotada pela Petrobras. A avaliação foi causada por queixa feita por Mauro Rodrigues da Cunha, ex-conselheiro de administração da estatal. Cunha pede que os ):>alanços de 2013, 2014 e 2015 da estatal sejam refeitos, em função de irregularidades praticadas “pelo acionista controlador e/ou administradores” da empresa. Desde 2013, a Petrobras usa seus contratos de exportação de petróleo para diminuir o efeito negativo da alta do dólar sobre sua dívida em moeda estrangeira. Rodrigues da Cunha foi conselheiro da estatal, eleito por minoritários donos de ações ordinárias, de abril de 2013 a abril de 2015.
Ele rejeitou as contas de 2013 e 2014, entre outros motivos, por conta disso. Se não adotasse a contabilidade do hedge, a Petrobras teria anunciado um prejuízo de R$ 71 bilhões em 2015-e não os R$ 34,8 bilhões oficialmente reportados. A informação consta das notas explicativas do próprio balanço da estatal. De forma simplificada, o que a empresa faz é subtrair, do total que a dívida cresce por causa da alta do dólar, o quanto as exportações também aumentam em valor.
No fim de 2015, a dívida bruta da estatal era de R$ 493 bilhões. Desse total, 84% são em moeda estrangeira, sendo 74% em dólar. A moeda americana teve valorização de 4 7% frente ao real, no ano passado -R$ 3,90 ante R$ 2,66. Com a depreciação da moeda local, a dívida internacional da companhia fica mais cara e maior. Após essa avaliação, a CVM pode abrir um processo sancionador, já com acusação, ou aprofundar análise por meio de um inquérito ou ainda se dar por satisfeita com as explicações da estatal e encerrar o caso. Na opinião de Rodrigues da Cunha, a prática da Petrobras não é adequada pois é importadora líquida.
A contabilidade de hedge da Petrobras é o oposto do retrato verdadeiro e justo da realidade, pondera ele. “Ela [a prática contábil] a permite operar -como tem operado – com enorme descasamento cambial, sem que seu lucro líquido seja proporcionalmente afetado. Ou seja, além de levaro investidor a “interpretar equivocamente a realidade econômica, pode ainda servir de conforto para que a administração assuma risco cambial desproporcional. Adicionalmente, pode fazer com que a companhia seja obrigada a pagar dividendos obrigatórios e partici pações nos lucros aos empregados, mesmo em situações onde seu endividamento exploda”, argumenta o ex-conselheiro à CVM.
A forma como a estatal registra, 0 que acredita ser uma proteção a sua dívida em dólar foi um dos motivos apontados por dois conselheiros fiscais para votos contrários ao balanço de 2015. Se gundo os indicados pelos minoritários Reginaldo Alexandre e Walter Albertoni, essa prática mascara o descasamento cambial da petroleira, que tem grande parte dos custos em dólares e a maioria das receitas em reais. Rodrigues da Cunha alega que o déficit comercial da Petrobras foi de US$ 15,8 bilhões em 2013, US$ 15 bilhões em 2014 e US$ 459 milhões em 2015. A xerife de mercado já pediu esclarecimentos à Petrobras e concedeu prazo até dia 15 para resposta.
Entre os questionamentos, a CVM soijcita que a estatal confirme “se os dados apresentados se referem à realidade das operações da companhia, durante os anos de 2013 a 2015, informando, em caso negativo, os dados corretos”. A autarquia também quer que a estatal confirme se sua “situação estrutural( … ), em termos de transações cpmerciais com o exterior”, é de importadora líquida. Consultada, a Petrobras não respondeu até o fechamento da edição. Rodrigues da Cunha, que atua como presidente da Associação de Investidores no Mercado de Capitais ( Amec ), preferiu não fazer considerações além das apresentadas à autarquia.