A relativa tranqüilidade esperada para a Bovespa neste ano, na comparação com o período eleitoral de 2002, também se estende ao câmbio. Alguns profissionais acreditam que o dólar atingiu um novo patamar, em torno de R$ 2,20, e que as empresas brasileiras terão de aprender a lidar com esta realidade. A escolha, pelo PSDB, de Geraldo Alckmin para competir com Lula à Presidência da República contribuiu para que as expectativas cambiais tivessem um cenário mais estável.
“Projeções sobre o câmbio são das mais difíceis de se acertar no mundo”, comentou o superintendente da Safra Asset Management, Valmir Celestino. “Mas podemos imaginar que as companhias terão de reduzir custos para se ajustar a uma nova realidade”, disse. “O dólar a R$ 2,20 tende a se consolidar e é um preço interessante. O errado era uma cotação em torno de R$ 3,00.” Para ele, o ano está praticamente dado, e as companhias que mais se beneficiam desse quadro são as voltadas para o mercado interno, como as elétricas. “Muita siderúrgica também vai ganhar com as vendas locais”, completou.
A percepção de que o dólar encontrou realmente um novo patamar é partilhada pelo gestor da Advalorem Reginaldo Alexandre. “Não há perspectiva de desvalorização da moeda este ano, pois não há nenhum risco iminente, a não ser uma reversão da situação no Exterior, mas isso não é provável”, afirmou. Segundo ele, a alta dos juros nos Estados Unidos já está embutida na conta dos especialistas.
No cenário local, um risco mínimo seria o crescimento da preferência do eleitorado, ao longo da disputa presidencial, por um candidato no qual o mercado não confia. Para Alexandre, exportadoras e empresas que atuam no setor agrícola tendem a perder com o novo cenário. Já companhias com negócios no Brasil e custos em dólar, ou devedoras em moeda estrangeira, tendem a se beneficiar.
“O ano pode ter alguma volatilidade, mas sem grandes motivos para estresse”, reforça Lika Takahashi, analista-chefe da Fator Corretora. Ela também espera um dólar em torno de R$ 2,20 em 2006. Na visão da especialista, o principal risco também é externo, de um estouro na bolha imobiliária nos Estados Unidos. “O comportamento do petróleo é outro ponto, mas não o mais preocupante.”
Para Lika, esse nível de câmbio prejudica os balanços das companhias e os efeitos perversos dessa equação serão mais evidentes este ano. Um dos motivos é o comportamento dos preços das commodities, que dispararam em 2005 e evitaram que os demonstrativos financeiros das exportadoras sofressem. Mas, neste ano, a perspectiva de alta nas cotações de tais produtos é bem mais modesta. “No caso da Vale do Rio Doce, por exemplo, o câmbio acabou com a vantagem competitiva que ela tinha em relação às concorrentes BHP e Rio Tinto”, acrescentou. As beneficiadas seriam as grandes importadoras de matéria-prima, que vendem para o mercado brasileiro.
O diretor da Planner Corretora, Luiz Antonio Vaz das Neves, também não espera mudanças na situação atual. Ele acredita que o principal risco é de desaquecimento da economia dos Estados Unidos acima do esperado. “Se a economia norte-americana reduzir o ritmo, o petróleo cai e os preços de outras commodities são puxados para baixo também”, observou. “Com isso, nossa balança comercial pode perder o superávit e teremos que correr atrás de medidas que garantam exportações melhores.” Nesse quadro, segundo ele, o risco dos emergentes vendedores de matérias-primas sobe e deve haver um movimento de “vôo para a qualidade”, o conhecido flight to quality, pelo qual recursos que antes eram direcionados aos emergentes voltam para mercados mais estáveis, como o dos EUA.
Neves acredita que, caso o cenário continue como está, a siderurgia se aquece e as exportadoras venderão bem ainda, pois a economia mundial está demandante. “A reclamação das exportadoras sobre o câmbio não encontra muito respaldo”, comentou. De acordo com ele, estas empresas aproveitaram o atual cenário, por exemplo, para reduzir brutalmente suas dívidas. No entanto, se o quadro se estressar, as apostas do diretor vão para as empresas voltadas ao mercado interno, como elétricas e as que atuam no setor de consumo.
(Aline Cury Zampieri)