Fluxo volúvel

Data Original: 09/10/2013
Postado em: 17 de dezembro de 2016 por: Reginaldo Alexandre
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Reportagens - Valor Econômico

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O investidor estrangeiro, que costuma ditar os rumos na bolsa local, voltou ao Brasil no terceiro trimestre, com uma força que provocou uma reversão no saldo aplicado na Bovespa e fez setembro registrar o segundo melhor resultado mensal do ano, ficando atrás apenas de janeiro. Mas, para analistas, o movimento foi pontual e não deve mais ser visto no quarto trimestre. As perspectivas não são negativas, mas o impasse fiscal nos Estados Unidos representa uma trava importante para todos os mercados, inclusive o brasileiro.

O fluxo de capital externo, que fechou negativo em R$ 4 bilhões em junho – pior mês de 2013 -, começou se reverter, ainda que moderadamente, nos três meses seguintes, contribuindo para a recuperação do Ibovespa. A virada começou tímida, com saldo líquido de R$ 58 milhões em julho, mas alcançou R$ 2,1 bilhões em agosto e R$ 4,248 bilhões em setembro – volume que só ficou abaixo do registrado em janeiro, de R$ 4,576 bilhões.

Com isso, o Ibovespa, que amargava queda de 22,1% no primeiro semestre, conseguiu reduzir as perdas no acumulado do ano para 14,1% até setembro. O movimento, contudo, foi apenas de recomposição, segundo analistas, já que a posição em Brasil estava muito descontada. Dúvidas sobre o crescimento da economia, pressão inflacionária, câmbio instável, eleições em 2014 e um relacionamento nervoso entre mercado financeiro e governo federal deixaram o Brasil na lanterna das bolsas mundiais. Problemas com a OGX, companhia de petróleo de Eike Batista e que faz parte do Ibovespa, também pressionaram o índice.

“Foi um acúmulo de frustrações, que acabou gerando apostas muito negativas [lá atrás]”, diz o presidente da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais (Apimec), Reginaldo Alexandre. “Esse quadro gerou efeitos colaterais, com a montagem de operações de derivativos, o que acaba alavancando o movimento e o mercado se torna sobrevendido”, afirma.

Além disso, destaca o estrategista do BB Investimentos, Hamilton Moreira Alves, em junho, o mercado passou a embutir em suas perspectivas a possibilidade de rebaixamento do rating soberano do Brasil, e a Bovespa ficou muito descontada. “Essa projeção criou uma pressão de cerca de 10 mil pontos no Ibovespa.”

A partir de julho, indicadores mundiais começaram a melhorar, o que provocou transferência de recursos para ações em todo o mundo, não apenas no Brasil, segundo Alexandre Póvoa, sócio da gestora Canepa Asset Management. “Saíram números melhores na China, nos Estados Unidos e até na Europa. Então, os estrangeiros começaram a eliminar as posições vendidas no Ibovespa futuro, até ficarem com saldo comprado”, diz. “A primeira coisa que o estrangeiro faz quando percebe uma melhora no cenário é zerar as posições vendidas.”

Com o maior apetite para risco, o investidor estrangeiro também acabou aumentando sua participação no volume negociado na Bovespa. Em setembro, os aplicadores do exterior ampliaram a liderança de movimentação financeira, com 46,13% do total, ante 42,09% em agosto. Os institucionais mantiveram a segunda posição, mas sua participação caiu de 34,25% para 32,01%. As pessoas físicas continuam a sair da bolsa. Foram responsáveis por 14,93% do total, ante 15,95% em agosto.

“Esse tipo de movimentação é histórico”, diz Alexandre, da Apimec. “Em momentos de recuperação, o estrangeiro sempre se posiciona antes, o local tem uma visão mais crítica. As dúvidas em relação ao desempenho da economia e ao cenário político pesam mais para os locais”, diz.

Depois do alívio que fez com que o terceiro trimestre do ano mostrasse recuperação, a exemplo do que aconteceu em janeiro, a tendência é de retorno à normalidade, acredita Alves, do BB. “O Ibovespa já bateu os 55 mil pontos, que é nossa meta para o ano, e não teve firmeza para sustentá-la”, comenta.

Para os especialistas, a tendência é de o índice variar pouco, ou ter uma pequena alta. A principal trava está nos Estados Unidos, e no impasse em relação ao Orçamento e ao teto da dívida do país. “Minha expectativa é que os Estados Unidos façam um acordo tampão e empurrem a decisão final para dezembro”, afirma Alves.

“O mês de outubro vai ser duro”, avalia Póvoa. A questão dos Estados Unidos é grave e o país pode anunciar default da dívida, o que deve gerar desconforto, argumenta. “Mas, se esse obstáculo for ultrapassado, podemos ter um fim de ano melhor, mais leve. Não será nada explosivo, mas se a China mantiver seu crescimento, a economia dos Estados Unidos continuar melhorando e a Europa não piorar, o quadro fica mais positivo.”

Os efeitos da trava do impasse americano já são sentidos na Bovespa. O volume médio diário, que em setembro ficou em R$ 7,1 bilhões, caiu para R$ 4,7 bilhões neste mês, um recuo de 34%. O Ibovespa sobe 0,2% até o dia 7 e o investidor estrangeiro tem saldo positivo no mês de apenas R$ 5,1 milhões até o dia 4.

“O aperto monetário nos Estados Unidos já está mais ou menos no preço. Se a questão fiscal se resolver, é eliminada uma trava, mas nada mudou por aqui”, lembra Alexandre, da Apimec. “Não vejo grandes perspectivas de mudanças”, comenta.

Will Landers, principal gestor de fundos para a América Latina da americana BlackRock, é mais otimista. Ele diz que, apesar dos riscos e de o país continuar a ter desempenho pior que os mercados globais, as ações brasileiras seguem com recomendação “top overweight” (acima da média do mercado) e negociando a uma relação preço/lucro (indicador que dá ideia do prazo de retorno do investimento) de 9 vezes na projeção para 2014. “Esperamos crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em torno de 2,5%, o que é um expansão maior do que a vista nos últimos dois anos.”

Para Landers, a redução na perspectiva do rating soberano do Brasil pela Moody’s feita recentemente, de positiva para estável, levantou outra bandeira de alerta sobre os riscos da recuperação econômica do país e a necessidade de trazer o crescimento para um nível de 3%. “Já vínhamos comentando que o principal risco para as ações brasileiras este ano seria uma recuperação fraca da economia, o que até agora tem sido o caso”, afirma. “Ainda assim, estamos vendo sinais de recuperação, redução do ritmo da inflação e indicações de que o Banco Central vem sendo mais ativo na questão inflacionária”, diz.

No geral, o anúncio da Moody’s deve servir como alerta para o governo brasileiro. “São necessárias reformas para reduzir o custo de fazer negócios no Brasil, mais agilidade para atrair investidores privados para projetos de infraestrutura e mais atenção na questão fiscal”, afirma Landers.

Para Alves, do BB, o setor de consumo deve ter boa performance, apesar da alta nos juros. “Será preciso pincelar ações específicas”, afirma. (Por Aline Cury Zampieri)

Sobre

Economista, com vinte anos de experiência na área de análise de investimentos, como analista, coordenador, organizador e diretor de equipes de análise, tendo ocupado essas posições, sucessivamente, no Citibank, Unibanco, BBA/Paribas, BBA (atual Itaú-BBA) e Itaú Corretora de Valores. Atuou ainda como analista de crédito corporativo (Citibank) e como consultor nas áreas de estratégia (Accenture) e de corporate finance (Deloitte). Hoje, atua na ProxyCon Consultoria Empresarial, empresa que se dedica às atividades de assessoria e prestação de serviços nas áreas de mercado de capitais, finanças e governança corporativa.

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