Analistas não podem distribuir relatórios avaliando o negócio
Na maior oferta de ações do mundo, ninguém pode falar absolutamente nada. A chamada “lei do silêncio”, que vigora 60 dias antes de pedidos de oferta de ações como o da Petrobras, impede que todos os participantes da operação emitam qualquer avaliação, opinião ou juízo de valor sobre a empresa. O objetivo, afirma a CVM, é impedir que, no calor da oferta, executivos e banqueiros “enfeitem a noiva” e induzam o investidor ao erro. “No momento de euforia, nunca vão lembrar, por exemplo, que o concorrente pode instalar uma fábrica no país e afetar os negócios. A gente quer uma decisão equilibrada”, disse Felipe Claret, superintendente da CVM. Como a capitalização da Petrobras é tão grande, a estatal contratou todos os bancos e corretoras, além dos principais consultores e advogados de direito societário.
São pessoas que não podem falar, sob risco de seu empregador ser excluído da operação do ano como ocorreu na abertura de capital da antiga VisaNet (atual Cielo), quando 23 corretoras foram desligadas-e seus clientes ficaram sem as ações reservadas -por propaganda inapropriada. Contratados por bancos e corretoras que trabalham na operação, os analistas do setor de petróleo deixaram de elaborar e de encaminhar relatórios de avaliação para os clientes, a maioria pequenos investidores individuais: O grande investidor tem acesso aos “road shows”, em que executivos da empresa e banqueiros expõem e tiram dúvidas sobre o negócio.
DECIDIR SOZINHO
Sem ajuda dos analistas, o pequeno investidor terá de decidir sozinho se deve investir numa operação que envolve o preço do petróleo (em 2020) que está a 5000 metros de profundidade, e cuja tecnologia para extração ainda não existe. A única fonte de informação é o prospecto, uma espécie de manual de instruções, que descreve a ·operação e os riscos potenciais do negócio. No caso da Petrobras, é um calhamaço de 620 páginas feito por advogados para impedir um eventual processo na Justiça.
Para Claret, há uma “over” interpretação da regra, que não limita o trabalho do analista mesmo que funcionário de uma instituição que trabalhe na operação. “Se o analista faz isso, tem um público, deve continuar. Não sei se ele se sente à vontade para fazer isso”, disse. Segundo Reginaldo Alexandre, presidente da Apimec-SP (associação dos analistas), a regra é clara e impede que funcionários de instituições participantes· dessas operações emitam opinião. “Pode ser problema de interpretação, mas é grande o risco.
O analista é um funcionário como qualquer outro. Na dúvida, ninguém fala.” Para Alexandre, o período de silêncio virou uma amarra que vai contra o interesse de quem deveria proteger. “Seria mais apropriado e racional que, em vez de proibir, os reguladores exigissem a publicação de toda informação disponível. Diz quem é e quais os interesses da instituição que representa.” (TONI SCIARRETTA)