O homem inoxidável

Data Original: 07/07/1999
Postado em: 10 de dezembro de 2016 por: Reginaldo Alexandre
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Carta Capital - Reportagens

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Com pique para surfar, praticar hipismo e jogo de cintura na política, o empresário conquista a América e quer fazer da sua siderúrgica uma potência mundial

JORGE GERDAU JOHANNPETER NÃO ESPERAVA a homenagem. Mas atendeu prontamente ao convite do presidente chileno Eduardo Frei, para subir ao palanque_ e· encerrar a entrevi􀀂ta a imprensa, naquela fna manhã de 16 de Junho, em Santiago. Em clima de fim de mandato (a eleição ocorre no final de 1999), Frei comemorava os US$ 8 bilhões de investimentos estrangeiros que aportaram em seu país no último ano. Destes, US$ 100 milhões foram desembolsados na construção da siderúrgica Aza Colina, da Gerdau, que começou a operar naquela data, com capacidade anual de 360 mil toneladas de aços longos. “Falei dos valores éticos no meu discurso”, diz Gerdau. Frei rompeu o protocolo outras duas vezes, o que só deixou mais engrandecido este carioca – “Mas com alma gaúcha” – de 62 anos, quase 30 deles à frente do Gerdau, um dos maiores grupos brasileiros de siderurgia. Deferências que entraram nos regis­tros deste empresário acostumado a lidar com o po­der – de João Goulart a Fernando Henrique Cardo­so, ele conheceu todos os presidentes brasileiros – e disposto a estender os domínios de sua siderúrgica para toda a América.

REDE AMERICANA

Nem bem descerrou apla­ca de Aza Colina, sua sexta fábrica fora do Brasil e a se­gunda no Chile, Gerdau teve fôlego para anunciar a construção de uma nova siderúrgica na América do Norte, a se somar às duas empresas no Canadá. Além de desmentir os boatos cada vez mais insistentes da compra da Companhia Siderúrgica Nacional ( CSN) e comunicar um aporte de capital de US$ 170 milhões na Açominas, o que deve aumentar a participação do seu grupo de 17,5% para 25%, ainda neste ano.

“Estamos construindo uma rede no continente americano para enfrentar a globalização. Precisamos ser fortes da Terra do Fogo ao Alasca”, afirma o terceiro dos quatro filhos de Curt Johannpeter e Helga Gerdau e, desde a década de 70, presidente do grupo. A suces­são contrariou o convencional nas empresas familiares, qual seja, de colocar o primogênito no principal cargo de comando. “Advogado e com formação em contabilidade, Jorge era o mais pre­parado’; afirma um consultor espe­cializado em sucessão familiar. Gerdau quer ser grande no con­tinente para não acabar engolido por seus pares mundiais. A antiga Fábrica de Pregos Pontas de Paris, fundada em 1901 pelo bisavô João Gerdau, produz atualmente 4,8 mi­lhões de toneladas de aços por ano. A líder mundial Nippon Steel atin­giu 26,9 milhões de toneladas em 1998.

Equivale à toda produção na­cional. O plano do empresário é es­tar entre as 20 maiores siderúrgicas no próximo milênio (hoje ocupa a 35• posição). “Com os menores custos de produção’: faz questão de frisar este liberal de carteirinha, que tem o filósofo austríaco Karl Pop­per como leitura obrigatória. NA ONDA. Fôlego para os ne­ gócios, fôlego nos esportes. O hi­pismo vem em primeiro lugar e o leva a competições desde os 9 anos de idade, quando saltou pela pri­meira vez no Country Club de Por­to Alegre. O surfe ainda rola sobre “pranchões’; nas praias de Santa Catarina. “Depois de enfrentar as ondas, não há plano ou pacote eco­nômico que assuste”, brinca ele, que, junto com o irmão Frederico, foi um dos prin1eiros a usar pran­chas do Havaí. As legítimas. A paixão pelos exercícios é tanta que após a inauguração da fábrica chilena, Gerdau deu uma esticadi­nha até a Alemanha para participar de uma feira anual de cavalos. De­certo, para alguma “comprinha” para seu haras no Rio Grande do Sul, onde cria a raça holstiner.

“O esporte aperfeiçoa a competitivi­dade e prepara para enfrentar de­safios. É a psicose de bater recor­des”, define o principal represen­tante da quarta geração da família do – ou de – aço. “Sou um ser com­petitivo e fanático pela qualidade.” Desde os 14 anos na empresa (assim como os seus três irmãos, ele começou a trabalhar nas férias escolares), Gerdau assumiu apre­sidência quando a produção batia em 1 milhão de toneladas de aços longos anuais e a atuação estava restrita ao território nacional. No ano passado, o grupo faturou R$ 2,27 bilhões, com lucro líquido de R$ 205,8 milhões, 50,9% maior do que o registrado em 1997. Quase 20% do resultado veio das unida­des localizadas no exterior.

Apesar da produção mundial ter sofrido queda de 2,5%, segundo o Interna­tional Iron & Steel Institute, as vendas da Gerdau cresceram 4,7% no Brasil e 4, 1 % no exterior. As cotações em Bolsa refletem o bom desempenho ( veja gráfico). Em março último, o empresário fez soar o sino que inicia o pregão da New York Stock Exchange, num ritual que marcou a estréia da empresa na Bolsa norte-americana. E as ações decolaram. “Há espaço para mais valorização’; avalia Reginaldo Ale­xandre, analista do Banco BBA. Em janeiro de 1998, o lote de mil ações era negociado a R$ 19. A crise asiáti­ca e retração no mercado p11,'<aram a ação para abaixo dos R$ 10 no final do ano passado. Na última semana de junho, no entanto, o lote era cota­do a R$ 28, Entre as razões para a alta, destacam-se a demanda por materiais de construção civil e por investimentos em infra-estrutura. Foi no final de 1996 que as ações ganharam atratividade. Nu­ma reestruturação acionária, a em­presa acabou com as “partes benefi­ciárias”. Por esse mecanismo, a fa­mília ficava coml0% do lucro líqui­do antes de distribuir dividendos aos demais acionistas – hoje, são 83 mil.

EM ACÃO

Homo politicus Ger­dau é por natureza. No cenário na­cional, coordena a Ação Empresa­rial. Trata-se de um movimento criado durante a revisão constitu­cional, em 1993, pelos maiores gru­pos privados, cuja principal bandei­ra é a reforma tributária. “Políticos e empresários são animais intuitivos e competitivos’; afirma, com a cancha de quem já foi cotado diversas vezes para assumir ministérios – o 1ütimo foi o da Produção, a tumultuada pasta que o presidente Fernando Henrique pensou em criar para Luiz Carlos Mendonça de Barros.

Nunca aceitou, nem parece estar nos seus planos fazê-lo: “Tenho ação política sem ser político”. A cadeira de em­presário lhe é mais confortável. “Tenho pena dos políticos, eles não donos da sua vida’: diz. Da sua disputada agenda, ele es­tima dedicar entre 20% e 30% aos interesses públicos (sem esquecer os 10% para o hipismo). Aqui se encaixam a presidência da Funda­ção Iberê Camargo – ele é fã do pintor gaúcho – e da Associação Qualidade RS. “O tempo de espera nos hospitais públicos gaúchos caiu para 13 minutos desde que as­sumi”, afirma, orgulhoso.

Sobre

Economista, com vinte anos de experiência na área de análise de investimentos, como analista, coordenador, organizador e diretor de equipes de análise, tendo ocupado essas posições, sucessivamente, no Citibank, Unibanco, BBA/Paribas, BBA (atual Itaú-BBA) e Itaú Corretora de Valores. Atuou ainda como analista de crédito corporativo (Citibank) e como consultor nas áreas de estratégia (Accenture) e de corporate finance (Deloitte). Hoje, atua na ProxyCon Consultoria Empresarial, empresa que se dedica às atividades de assessoria e prestação de serviços nas áreas de mercado de capitais, finanças e governança corporativa.

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