Os balanços do segundo trimestre manterão o universo empresarial brasileiro polarizado. De um lado, as exportadoras, com números fracos pela baixa demanda internacional e ainda mais afetados pelo recuo do dólar no período. Do outro, as empresas de varejo e focadas no mercado doméstico, vivendo um cenário mais tranquilo, o que inclui estímulos de programas governamentais.
A maior novidade desta safra de números ficará por conta do alívio na última linha do balanço das companhias com dívida em dólar, em função da forte queda da moeda americana no período. De abril a junho, o Brasil registrou a maior desvalorização do dólar da década: 15,7%.
“Os ganhos das endividadas com a reversão das perdas serão significativos”, segundo Reginaldo Alexandre, presidente da Associação dos Profissionais de Investimentos em Mercado de Capitais (Apimec-São Paulo). Ele lembrou de companhias como a geradora de energia Cesp, a siderúrgica Gerdau e a petroquímica Braskem, que possuem compromissos relevantes em dólar.
Mas a variação da moeda auxiliará algumas e prejudicará outras. Para quem vende em dólar, a notícia não é boa, especialmente quando o volume já não é dos melhores. Já para aquelas cujos custos sofrem impacto da moeda, a correção do aperto provocado pela crise vem dar fôlego às margens.
No caso das exportadoras, também é preciso lembrar da demanda produzida pela China, que manteve a procura por algumas commodities aquecidas, como minério e papel e celulose.
Contudo, vender para o gigante asiático – principalmente no mercado à vista, sem contratos de longo prazo – pode significar abrir mão de margem: o preço quase sempre é mais baixo e o custo de frente é caro. Eduardo Roche, analista da Modal Asset Management, acredita que esse pode ser um componente negativo do balanço da Vale, por exemplo.
De forma geral, a expectativa é que os balanços ainda mostrem piora operacional na comparação com igual intervalo de 2008. Porém, ao olhar o pulso dos negócios, a análise frente aos três primeiros meses do ano deve indicar estabilidade e até uma ligeira expansão.
Para Alexandre, da Apimec-São Paulo, os dados serão importantes justamente para se começar a medir os efeitos das iniciativas governamentais e também da ligeira recuperação de atividade.
Os investidores, contudo, não estão muito animados com os números. Mas também não estão tão preocupados, quanto estavam no começo do ano, quando se esperava o pior – mesmo sem saber o que era esse pior, exatamente. “Quando se pensa em Bovespa, o foco maior está em fluxo, ou seja, se o estrangeiro continuará investindo aqui”, destaca Catarina Pedrosa, analista chefe do Banif Investment Banking.
Há algumas boas novas de segmentos específicos. A Associação Brasileira da Indústria Eletro Eletrônica (Abinee), por exemplo, já acredita que a venda de computadores pessoais irá se recuperar a ponto de alcançar os níveis de 2008, com 12 milhões de unidades comercializadas. Mas para se ter uma medida do antagonismo com as empresas que dependem do aquecimento do mercado externo, as siderúrgicas vivem forte retração, o que inclui fechamento de fábricas.
Para Catarina, o principal motivo de não se esperar grande aquecimento na atividade das empresas, na comparação com o primeiro trimestre, é o fato de o acesso a credito continuar difícil, tanto para companhias, como para pessoas físicas. “O crédito cresceu muito pouco e as projeções macroeconômicas, embora um pouco melhores, ainda não são suficientes para mudar a perspectiva geral do ano.”
De fato, os dados gerais da economia não trazem viradas radicais. No ano, o volume mensal total de crédito concedido no país – pessoa física, jurídica, BNDES e rural – subiu apenas 1,8%, para R$ 886 bilhões, considerando dados de maio. A velocidade de expansão em 2008 foi incomparavelmente maior: 32%, para R$ 871 bilhões em dezembro do ano passado. Quanto ao Produto Interno Bruto (PIB), no relatório de junho sobre inflação, o Banco Central reduziu a projeção para 2009, de alta de 1,2% para apenas 0,8%.
Dessa forma, a sensação de alívio que os dados dos três primeiros meses do ano trouxeram – de que nem tudo estava perdido, especialmente para o varejo – talvez não se repita com os números do segundo trimestre. Deve faltar o elemento surpresa. Na época, atribui-se às boas novas aos reflexos das iniciativas do governo para dar liquidez e minimizar a escassez de crédito.
Agora, o entendimento é que as últimas medidas relevantes do governo na economia foram tomadas durante o segundo trimestre e ainda não serão sentidas em sua plenitude, como o esforço para melhorar o cenário para bens de capital e as iniciativas para estimular a redução no custo de crédito, por meio dos bancos federais.
“O movimento inicial é sempre de queima de estoque. Ainda não se perceberá aquecimento de produção”, destaca Roche, da Modal Asset Management, ao falar sobre o reflexo dos cortes no imposto sobre produtos industrializados (IPI) da linha branca e marrom.
Por isso, para a indústria, de maneira mais abrangente, as melhores apostas estão reservadas para o terceiro trimestre. Os números que serão conhecidos agora servirão apenas para dizer se essa expectativa deve ser mantida. “As empresas estão trabalhando com 80% da capacidade. Ainda se vê muito consumo de estoque e pouca produção nova”, disse Catarina.
No Brasil, a temporada de resultados estreou ontem com a Localiza, empresa de aluguel e revenda de carros. Melhorar o financeiro continua sendo o foco da empresa, que ainda enfrenta desafios para voltar a expandir o negócio. A empresa tomou a dianteira da fila dos balanços da Aracruz, que se perdeu na crise com contratos cambiais de risco.
Enquanto no país, não há grande temor sobre os números, no exterior as preocupações estão bem presentes. “Mesmo que se tire efeito cambial positivo, a contração de atividade no Brasil foi muito menos severa do que nos Estados Unidos e na Europa. Sem contar que os juros estão nos níveis mais baixos da história do país”, lembra Alexandre.